Tradução e qualidade em tempos de crise

quarta-feira, abril 1st, 2020

Não é novidade para ninguém que, no momento, estamos enfrentando tempos de crise. A pandemia, junto com a importante necessidade de permanecer em casa, e a informação chegando de diferentes locais do mundo, abre a nossa cabeça para, na nossa área, entender melhor o papel da tradução em momentos de pânico e crise. Afinal, desastres naturais, pandemias e catástrofes atingem povos diferentes, com sua língua, crenças e cultura particulares, e a informação deve chegar a todos por igual, com uma urgência maior do que o normal.

De forma simplificada, segundo o livro “Translation in Cascading Crises”, de Federico M. Federici e Sharon O’Brien, a maneira de lidar com uma crise está teoricamente subdividida em três partes, com necessidades diferentes de acordo com a etapa. Permitir, através da linguagem e da comunicação, que grupos vulneráveis (apesar de, geralmente, todos serem atingidos) tenham acesso a informações permite que se tornem mais resilientes, preparados, e capazes de enfrentar uma crise. Um bom exemplo disso é o caso das instruções sobre o COVID-19 dadas pela casa branca, que mencionamos neste post.

Mas como dedicar tempo e recursos à tradução no meio de uma situação extrema? Os autores afirmam que, nessa primeira etapa (“reagir” à crise), por ser mais rápida, quando não há outra solução, a tendência é que seja utilizada a tradução automática (que, hoje em dia, se tornou um tópico de grande debate e está ganhando cada vez mais espaço, e ficando mais precisa, dentro da tradução profissional), por ser um recurso mais instantâneo, que não requer disponibilidade ou um contato direto. Logo em seguida, na segunda etapa (da “resiliência”), onde se está começando a andar em direção a uma recuperação, é comum recorrer a membros da comunidade, às pessoas bilíngues em geral, e aos tradutores comunitários. Finalmente, quando a parte mais pesada da crise já foi superada e se alcança a fase da recuperação, chega a hora dos tradutores profissionais agirem.

Dessa forma, podemos compreender que, em momentos como o atual, a qualidade não é foco. O importante é conseguir atingir todas as pessoas e todos os grupos culturais com a informação, espalhar conceitos de prevenção ou cuidado, dependendo do que a situação exigir. Na medida que a crise começa a ser dominada, a qualidade começa a aumentar, já que os recursos empregados passam a ser mais qualificados. De modo geral, toda essa problemática revela que, talvez, o preparo das sociedades em relação à comunicação ainda precisa melhorar, já que além de ser um recurso para a população enfrentar situações difíceis, a comunicação e o acesso à informação é um direito humano.

Um exemplo claro é a forma como o mundo se preparou para a chegada do Corona vírus. Assim que a crise eclodiu na China, os pesquisadores começaram a divulgar conhecimento, a produzir conteúdo, e esse material viajou pelo mundo inteiro e, apesar de não sabermos ao certo qual foi a qualidade e como foi feita a reprodução dele, o mundo inteiro recebeu as orientações de proceder com a quarentena nos casos suspeitos e o lockdown geral, que continua firme no Brasil e no resto do mundo.

O que podemos tirar desta reflexão é que talvez esteja chegando a hora de ter uma maior consciência sobre a importância de uma preparação multicultural e multilinguística, já que a tradução e a interpretação são áreas que revelam cada vez mais seu papel fundamental no nosso atual mundo globalizado. É o nosso papel, como tradutores, tentar participar ativamente neste processo para conseguir, da melhor forma possível, garantir a circulação das mensagens por todo o mundo.


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